Sobre a chegada do Exmo. Revmo. O Sr. Bispo,
remeter-nos o seguinte: A entrada de S. Exc.ª. Revmo.
Acha-se restituído aos seus penates, depois de uma excursão de 4 meses e meio o Sr. D.
João Antônio dos Santos, Bispo da Diamantina.
A sua entrada na cidade foi uma ovação popular.
A esboçamos em breves palavras com a singeleza dos fatos.
Às 12/2 horas do dia 31 do corrente um portador chegou do Rio Manso anunciou, que em
poucas horas S. Exc.ª. Revmo., se acharia entre nós, ao mais tardar às 5 horas
desse mesmo dia. Imediatamente agitou-se a cidade, os sinos começaram a tanger
em sons festivos, girândolas de fogos atroam os ares. - E o alvoroço apossou-se
do peito de todos,
cada qual querendo ser o primeiro a tributar ao venerando prelado suas preces de
amor e congratulação por tão próspera vinda.
Cavalgadas improvisaram-se aos centenárias, núcleos de famílias, ondas de povo, todos
acudiram pressurosos para saudar a vinda do chefe entre seus súditos em Jesus
Cristo. Entre essas e outras espontâneas demonstrações, que pintaram a
cordialidade com que eram feitas,
destacou-se uma, que se pode considerar a mais feliz inspiração do momento.
Um magnífico Cruzeiro, pesando cerca de 60 arrobas, foi levado em braços por
cidadãos de todas as classes para ser fincado no cimo mais alto da serra, que
circunda a cidade, como comemoração da volta do santo pastor ao meio de suas ovelhas.
Em sua frente atacavam-se centenas de fogos e
bombas; atrás do préstito tocava a excelente banda de música O Coro Grande
Essa ideia toda da iniciativa do Sr. Comandante Herculano Carlos de Magalhães e
Castro, que às suas expensas mandou construir o Cruzeiro, deu verdadeiro brilho
e realce ao recebimento de S. Exc.ª.
Em poucos instantes a serra do Rio Grande povoou-se, como por encanto, de ondas de
povo, multidões condensadas e compactas, que desenhavam à distância, o mais
lindo panorama, que pode imaginar-se!... De 3.500 a 4.000 indivíduos foi
calculado o número de pessoas, que acudiram ao encontro de S. Exc.ª, há mais de
uma légua da cidade.
Serra São Francisco e o Cruzeiro da Serra - Diamantina-MG Acervo: Erick
Um grupo de cavaleiros adiantou-se mais sobre
os outros até encontrar o venerando Bispo Diocesano e a sua simpática comitiva;
então todos de um só movimento se apearam, e curvando o joelho, beijaram as
sagradas mãos de S. Exc.ª... começando a inquirir do estado de sua preciosa
saúde. S. Exc.ª. incomodado, desde alguns dias era transportado em uma liteira.
Mais próximo chegado, feito o sinal de convenção, o povo voou ao encontro de
seu pastor, felicitando-o viva, cordial e sinceramente, desprendendo os
animais, que carregavam a liteira, e carregando-a em ombros, disputando-se a
glória desse transporte de filhos para com seu carinhoso Pai. O Sr. Bispo
abençoando, com seu sorriso de bondade nos lábios, a todos quanto dobravam o
joelho para vê-lo passar, era o emblema da virtude: e santidade de modéstia!
Á’ muito custo pode o Exmo. Prelado romper
por entre a multidão compacta, que se aglomeravam em redor dele para beijar-lhe
as mãos; mas enfim conseguiu chegar à capela, que se havia improvisado de
folhas de palmeira coberta de pano; em frente da qual achava-se o Cruzeiro
enfeitado de flores, e destinado a ser bento por S. Exc.ª. Reverendíssima.
Antes, porém, da cerimônia de bênção o digno Juiz de Direito Dr. João Salomé de
Queiroga pronunciou uma breve, mas tocante alocução, na qual em seu nome, e em
nome do povo, se congratulava com S. Exc.ª, pela sua feliz chegada à Sé do
Bispado, é ao seio de sua saudosa família e diocesana. O honrado magistrado
aproveitou daquela solene ocasião para expandir seu gênio republicano, dando
oficialmente à S. Exc.ª. reverendíssima a fausta e auspiciosa notícia da nova
lei sobre o elemento servil.
O Exmo. Prelado recebeu-a com a expansão do júbilo, pois é sabido, que foi um dos mais
ativos colaboradores de ideias tão humanitárias. Sabe-se nesta Cidade que os
brilhantes artigos publicados pelo Jequitinhonha no ano de 1861 sobre este assunto eram da ilustrada
pena de S. Exc.ª. e por isso a lembrança foi muito aplaudida.
Seguiu-se a benção do Cruzeiro por S. Exc.ª. e já era noite fechada quando imenso
préstito o acompanhou à Sé da Cidade, onde o Coro Grande desempenhou com toda
pompa o magnífico Te-déum de Henrique Alves de Mesquita, o célebre maestro
brasileiro.
Da Sé foi S. Exc.ª. acompanhado pelo povo e música até o Palácio Episcopal, onde tem
a sua residência.
Raiou alegremente o dia de Todos as Santos.
Como na véspera alastrou-se a estrada da serra de nuvens de povo e 4 ou 5:000
pessoas achavam-se pelas 11 horas reunidas no píncaro, onde se projetava elevar
o magnífico Cruzeiro, comemoração da volta do Santo Prelado. Um sino para ali
transportado repicava festivamente, chamando os fiéis à oração. Fogos se
repetiam de instante a instante, e o povo galgava as cumeadas da serra por
todas as devesas do caminho.
O prazer transluzia no semblante de todos, o sorriso da satisfação geral espraia
nos lábios.
Ao meio dia celebrou-se uma missa cantada, ainda tocando o Coro Grande, a mais luzida
música da Diamantina.
Cruzeiro da Serra - Iluminado. Diamantina-MG - Acervo: Erick |
orador sagrado e distinto Sr. Padre Sipolis superior do Seminário Episcopal, e
pronunciou um eloquente sermão, elogiando a viva fé dos diamantinenses, e o
amor de quem haviam dado provas å seu pastor.
"Aquela Cruz, dizia o inteligente pregador, não deve ser um marco somente de
comemoração, mas uma arma de combate para fortalecer a fé, vencer a iniquidade.
Como no sinal aparecido ao Grande Constantino, deve-se ler no alto dela estas
palavras sagradas—in hoc signo vinces!” Neste sinal vencerás."
Guindou-se em seguida o Cruzeiro, que, içado
por tesouras e cordas, em poucos minutos começou a dominar de todas as alturas
a nossa querida Cidade a sede do Bispado,
A união dispersou-se tão alegremente como havia sido formada."
0 Jequitinhonha, como intérprete deste povo, saúda cordialmente a volta de S Exc.ª. Reverendíssima.
O Jequitinhonha, pág.1-2, 5 de Novembro, Diamantina-MG, 1871
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