No início do
século XX, dois partidos políticos se degladiavam violentamente no município: o
“Sessenta e Nove”, chefiado pelo senador Olimpio Mourão, agente executivo e presidente da Câmara Municipal, apoiado
pelo jornal “O Norte” , o “Quarenta e Cinco”, constituído pela coligação das
famílias Caldeira Brant e Mata Machado, sustentado pelo jornal “Idéia Nova”.
No
Parque Municipal, no Largo do Rosário e Antiga Cavalhada, realizavam-se aos
domingos, das cinco ás seis horas da
tarde, concertos da Banda de Música do 3º Batalhão da Brigada Policial, sob a
regência do sargento Manoel Felix, que
exímio cantor de modinhas e perito tocador de violão, nas serenatas (castelos),
conforme a denominação local.
Fundava-se o secreto clube político
“Delenda Cartago”, que tão importante papel desempenhou nas eleições
municipais do fim desse ano.
Os festejos do
Carnaval decorreram com alguma animação: de dia mascarados pelas ruas; no
Domingo gordo, Segunda e Terça-feira , á tarde, cortejo carnavalesco, com o
Júlio Procópio, num andor, fantasiado de Báco; á noite baile masquê no Teatro
Santa Isabel.
A 26 de fevereiro
falecia repentinamente, aos vinte e oito anos, o malogrado poeta Edgard da Mata
Machado. Justamente, um mês depois, a 26 de março, morria o seu irmão mais
velho, João da Mata Machado, ambos filhos do Conselheiro Mata Machado. No largo do Rosário existia ainda o
velho e tradicional Teatro de Santa Isabel, a cuja porta assentava-se, ás
tardes, um grupo de “tesouras”, a cortar na vida alheia. Pouco adiante
erguia-se grande e velhíssima gameleira, vetusta tradição dos tempos coloniais.
Uma semente desta árvore, levada pelo vento ou pássaros, fora brotar e
desenvolver-se no cruzeiro de madeira, em frente á igreja de Nossa Senhora do
Rosário dos Pretos, constituindo
interessantíssima curiosidade local, desparecendo o cruzeiro, com o crescimento
da árvore.
Perambulavam pelas
ruas curiosos tipos populares: Juca Bonifácio, o Butifarra, Maria do Zé
Eleutério, Camilinho do Palácio, Terêsa Doida, Pedro Duraque, Salviano, preto
de pernas tortas, sempre carregando nas procissões uma grande cruz de prata.
Em modesta casa, no fim da rua do
Rosário, quase perto do Largo, residiam os irmãos Moisés de Paula, Manoel Arrã e Modesta Arrã, célebres pela feiura, verdadeiros Quasimodos.
O “Parentinho”
(Augusto Teixeira Gente), comensal de todos os banquetes e jantares
comemorativos, recitava, solene e compenetrado, sonetos, poesias, motes e
glosas dos antigos poetas diamantinenses. O Agostinho Lopes Detalonde, temido
por sua bravura (caráter leal e coração boníssimo) fazia discursos inflamados
nas manifestações políticas dos “Quarenta e Cinco”. O Ourives Antônio de Pádua
Oliveira, discípulo do Ezequias Lopes, falecido pai do Detalonde, burilava
finíssimas taças de coco e ouro, verdadeiras obras de arte.
O Padre Antônio Torres, fanático
por Eça de Queiroz, publicava interessantes crônicas na “Estrela Polar” e na
“Idéia Nova”.
Os pontos mais
sociáveis da cidade, á noite, onde se jogava e cervejava á grande, eram: o Bar
do Teófilo Batista, o Restaurante do Assis Moreira e o armazém de D. Maria do
José Eleutério, no Beco da Tecla. Em pequenas casas deste beco, a Calu e a Tia
Plácida (Placidina) serviam modestas ceias de galinha de molho pardo,
almôndegas, linguiça com farofa e o infalível parati. Havia
na cidade duas bandas de música: o tradicional
Corinho, fundado no tempo do império, do partido Conservador, dirigido
até dois anos antes pelo maestro Antônio Efigênio de Souza (“O Paraguai”),
falecido em 1905, e a Banda Comercial, de fundação recente. O Corão, banda dos
liberais, fundada no tempo da monarquia, já havia desaparecido. Cabalavam
fortemente e com sucesso, na política
local, os irmãos Andrades: Anselmo, Felix, Pedro e Martinho, o primeiro do
partido dos “Sessenta e Nove” e os outros do grupo dos “Quarenta e Cinco”. A Lapa do Claúdio, no Rio Grande, era o
ponto preferido para os piqueniques. Circulavam quatro semanários: “A Estrela Polar, Pão de Santo Antônio,
Idéia Nova e Norte”. Ainda existia em
Diamantina a velha e bárbara tradição do Entrudo, com limões de cera, seringas
de bambu ou de folha de Flandres, canoas d’água pelas ruas, assaltos aos
transeuntes pra molhá-los, mergulhá-los nos chafarizes e até escaladas ás
janelas das casas e famílias. Na véspera de S. João, 23 de junho, desde as duas horas da tarde, era
perigoso sair á rua, parecendo a cidade uma praça bombardeada, tal a quantidade
de bombas, bombonas e busca-pés, a estourarem por todos os lados. A Cachoeira do Glória, no Rio Grande, era o
banheiro dos rapazes diamantinenses. O barbeiro Italiano Domingos d’Ascenzo ,
que, em 1895, abraçara e beijara, em plena rua, uma aluna da Escola Normal, não
perdera a esperança decasar-se com uma jovem diamantinense. Em
setembro realizava-se com toda a solenidade, o Congresso das Municipalidades do
Norte de Minas, com a presença do Presidente do Estado, Dr. João Pinheiro da
Silva, do Secretário do Interior, Dr. Manoel Tomas de Carvalho Brito,
presidente das Câmaras Municipais e
numerosos políticos. Nessa ocasião inaugurou-se o primeiro
Grupo Escolar da cidade, sob a direção do autor destas linhas seguinte corpo
docente: D. D. Maria Correa de Oliveira Mourão, Liseta Queiroga, Hilda Rabelo
da Mata Machado, Agostinha de Sá Correa Rabelo, Julia Kubitschek, Custodia
Brant, Edésia Correa Rabelo e Eponina de Mata Machado, Porteiro o sr. Francisco
Regulo Perpétuo e servente D. Augusta
Bago. Nessa época os
enterramentos eram feitos nas igrejas do Carmo, das Mercês, de São Francisco e do
Rosário, pois o cemitério, construído em 1890, só começou a ser utilizado em
1912, data em que desapareceram os sepultamentos nas igrejas.
A casa comercial mais
importante da cidade e do Norte do Estado era o grande Empório do Norte, de Mota
& Companhia, com preços fixos honestamente reduzidos.
Foi em 1907 que o negociante João
José Dias começou a modernizar o comércio de Diamantina, estabelecendo um
grande bazar no largo do Curral ( Praça Dom João), também com preços moderados. ARNO Ciro.
Tempos Idos, Voz de Diamantina, 1957.
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