“Meu avô e meus tios moravam na caverna. Como os antigos eram caboclos, colocaram o nome de Lapa dos Caboclos. Pensavam que os desenhos foram feitos por índios e esse é um dos lugares que têm mais pinturas em Diamantina. E olhe que conheço bem a região”, garante o homem, que se orgulha de ter trabalhado na vasta área rural do município do Alto Jequitinhonha, onde percorreu muitos sítios arqueológicos. Ele se nega a levar “qualquer um” até a caverna, devido às depredações do passado e porque o terreno é de um parente.
(foto: Juarez Rodrigues/EM/D.A Press)
O aposentado José Balbino Pereira, de 76 anos, conhece como poucos as cavernas na região de Diamantina
Da residência do senhor José Balbino até a caverna são quatro quilômetros de estradas de chão, passando casarões de telhas antigas e barracões de pau a pique nas fazendas, córregos com pontes de madeira rústica, lagos e plantações de capim. Passada a última porteira, o aposentado desce do carro e procura seu parente numa área de pasto e depois num casarão comprido. Daquela baixada se avista de frente a formação rochosa que domina o horizonte, o Pico da Tromba D'Anta. É uma pedra cinza e pontiaguda, que pende inclinada a 1.360 metros de altitude.
A demora para o caboclo retornar dá a impressão de que a visita à lapa seria proibida. Mas o seu retorno, sorridente, após alguns minutos, mostrou que a permissão foi concedida. “Ô, gente, vocês desculpem. Meu primo está mexendo leite no tacho para fazer doce de leite. Se parar, queima tudo. Ele pediu para não reparar e para levar (a reportagem até) lá”, disse, cordial.
A caminhada é curta, passando por plantações rasteiras de feijão e ervas, depois seguindo o curso de um córrego, até que se abre a Lapa dos Caboclos. Uma formação natural de equilíbrio intrigante, já que a sua abertura de acesso toma quase toda a extensão horizontal da rocha, parecendo não haver pilares suficientes para sustentar o teto de pedras de oito metros de altura. De lá do alto, como se fossem cordas de montanhistas, as raízes finas de algumas plantas descem até o solo da trilha, onde se fixam.
A aproximação com a boca da caverna torna visíveis parte dos desenhos pré-históricos. São traços enfileirados que os arqueólogos supõem se tratar de contagens, provavelmente de tempo ou de animais abatidos pelos caçadores primitivos.
O primeiro salão é o mais amplo. Permite a entrada plena da luz do dia, destacando a tinta vermelha de milhares de anos usada em inscrições que retratam veados, tatus, pacas, aves e peixes. No teto, figuras humanas em posições que sugerem movimento indicam atividades como coreografias rituais que podem ter ocorrido sob aquela mesma laje. Boa parte do teto, no entanto, foi densamente recoberta por fuligem negra.
A fuligem não é a única marca de destruição neste tesouro arqueológico. Riscos modernos de carvão com assinaturas de invasores e formações rochosas destruídas no interior das câmaras mostram a vulnerabilidade da Lapa dos Caboclos. “Antes, as pessoas moravam aqui e o fogo destruiu muita coisa. Depois teve gente vindo para acampar e fazer arruaça. Por isso não deixamos mais ninguém entrar, porque senão acaba”, disse José Balbino.
Fonte:em.com.br gerais
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