Coisas do passado de Diamantina
Do livro inédito do professor
José Augusto Neves
O 3 de maio em Diamantina
Outras notas
Desapareceu, de há muito,
nesta cidade, a simpática e atraente festa do antigo Cruzeiro do Rosário, que
agora, fica as escuras, na solidão—cruzeiro que aquela original gameleira dele
se
apossou, partindo-o pelo meio,
a procura da terra. _
Nos antigos tempos, realmente,
a festa do Cruzeiro do Rosário era um encanto, quando dela se encarregava o
simpático velho Cláudio Ribeiro de Almeida, agente do correio e diretor—regente
da banda de música do «Coro Grande» ou «Corão!», nome que parece ter sido
adotado, em anteposição ao «Corinho», outra banda local que havia na cidade, e
considerada sua rival.
O velho Cláudio era bom musico
e cantava bem. Parece que qualquer incomodo o impedia de caminhar, pois tinha
um burrinho queimado, em que vivia amontado, sendo, ás vezes, carregado pelos
populares Cassimiro e Pedro, vulgo Bigorrinha.
D. Ritinha, senhora distinta e
mui relacionado em Diamantina, era esposa do Cláudio e mãe do Claudino,
elemento de destaque em nosso meio, não só na imprensa, como no Foro local.
D. Ritinha, todos os anos, no
dia da festividade do Cruzeiro do Rosário, encarregava-se, com carinho, do café
com cuscus ou broas saborosas, para obsequiar aos devotos que rezavam até
alta noite, ao relento, o
santo terço, ao pé do Cruzeiro, sempre caiadinho de novo e iluminado a candeias
de azeite fumarento, feitas de argila amarela ou de cascas de laranja azeda seca.
Ao aproximar-se o dia 3 de Maio,
a calçada fronteira á igreja do-Rosário, era capinada pela meninada. Postes de
madeira branca; roliça (paus a piques), se levantavam, para se erguerem
as arcadas de bambu,
enfeitadas de taquara indígena e de papagaio, folhagem vermelha e leitosa, só empregada
na ornamentação dos cruzeiros, ou das ruas, por ocasião das procissões da Ressurreição
e Corpus Christi, espalhada sobre a areia cristalina do Rio Grande, ou das
furnas do Beco do Amontolia.
A iluminação dos cruzeiros era feita com
lanternas de papel multicores, dependuradas nas arcadas, e por fogueiras da
nossa canela de azeite ou perna de ema, excelente combustível de nossos
terrenos arenosos, entre serras.
Imagem da internet
O velho Cláudio, insuante e
bom, era o agente do correio da cidade e a correspondência nos vinha de Ouro
Preto, em lombo de burro, a princípio, de 4 em 4 dias. passando pela estrada do
Serro.
As 2 horas da tarde mais ou
menos, os anciosos por notícias da Capital e da Corte (RioJ, se aglomeravam atrás
da velha Igreja do Rosário, á espera que apontasse, na longínqua estrada do Ribeirão,
os burrinhos do Correio. Quase todos que esperavam o correio, assistiam á
abertura das malas, e o agente Cláudio lia, em voz alta, o endereço das cartas,
recebendo cada assistente a sua. Pouco tempo depois, a agência teve um
carteiro, o Dedico, que foi substituído, mais tarde, pelo Luiz Xodó, poe do Pe.
Luiz Transfiguração; pelo Mundino Botija (Raimundo Nonato do Silva). Jucá Boi
(José Joaquim da Conceição) e pelo popular Valongo
(José Antonio de Lima).
Tempos depois, foi nomeado
agente o sr. Gustavo Soares de Vasconcelos Lessa, transferindo-se a agencia
para sua residência, á Praça Barão de Guaicui, antiga Cavalhada Velha e hoje
mais conhecida pelo nome de
Praça do Mercado. Um foguetão anunciava a chegada do correio.
Anos depois, foi instalada em
Diamantina a Sub-Administração dos Correios, subordinada á Administração de
Minas.
CÔRO DA VELHA SÉ.—Ainda
guardamos na memória aquele coro da velha Sé, de que era harmonista o saudoso
conterrâneo João Nepomuceno de Silva (o João Botija), tio do narrador
destas linhas, e que morava atrás
da Igreja do Rosário. Compunha-se esse coro de suas dignas filhas, todas
inteligentes e músicas: Ana da Natividade Silva, Maria Josefina da Silva,.
Virginia da Silva e Teodora Cândida da Silva, esta. a única sobrevivente, viúva
do saudoso prof. João Procopio Gomes Ribeiro. Esse coro era custeado pelo Sr. Bispo D,
João—Certa vez, tendo as moças alunas da Escola Normal feito uma promessa de cantarem,
nas solenidades, durante o Mês de Maria, se fossem felizes nos exames finais,
alcançaram, afinal, a graça imperada,
e foram cantar no Mês de Maria,
acompanhada do maestro João Batista de Macêdo (o Pururuca-) e de alguns
músicos: da banda do «Corão», cumprir o voto que fizeram.
O João Botija, porém, como
harmonista da Sé, não teve, por isso; no primeiro dia do Mês de Maria,
trancou-se no coro do velho templo, e recusou-se a abrir a porta para as
normalistas e
músicos do «Corão». Lá se
trancou pôs-se pacientemente, a tocar harmônio, sendo preciso que as moças-normalistas
e os músicos funcionassem mesmo cá de baixo, no Mês de Maria.
No dia seguinte, porém, o
santo Bispo, tudo harmonizou.
João Botija era bom músico, fora
sargento de polícia, com divisas de galão, naquele tempo, e também porteiro da
Intendência Municipal.
Primeira Escola Normal de
Diamantina!—Esta escola nos deu o grande parlamentar diamantinenses conselheiro
João da Matta Machado, que, em certa ocasião, nossa terra recebeu com
estrondosas festas, entregando-lhe a sua chegada, vindo do Rio a chave de ouro
do portão de sua cidade natal, ali no termino do Caminho do Carro, em frente á
antiga casa do Comendador Serafim Moreira da Silva, hoje propriedade da viúva
João Antonio de Sousa Neves.
E que professores de peso e
medida tinha aquele estabelecimento de ensino!
Compunha-se, assim, o seu
corpo docente: Sebastião Corrêa Rabelo, professor de Português-; João N. Kubitschek
(autor da Hermengarda), professor de Pedagogia, História Sagrada e catecismo;
dr. Francisco Corrêa Rabelo, de Aritmética dr. Teodomiro Alves Pereira, de
Geografia e História do Brasil; José Joaquim Pedro Lessa, de Francês; José da Cunha
Vale Laport, Geometria e Desenho; e depois também de Caligrafia e Ginástico;
João N. Ribeiro Ursini, de Música; da Escola Prática do sexo masculino: 1º professor
D. Carlos Frederico de Castelo Branco Rolim; 2º prof. José Ferreira de Andrade
Brant Junior; 3º. prof, João da Matta Gomes Ribeiro Sobrinho; da escola pratica
do sexo feminino; 1ª professora, d.
Joaquina Lopes de Almeida: 2a, d. .Maria Salvelina Alves Pereira; 3ª., sua
filha, d. Inhazinha Alves Pereira; 4ª, d. Garibaldina Rocha; d. Josefina Coelho
Refeld; d. Realina Teixeira de Sousa, inspectora de alunas, lecionava
Calistenia (ginástica de salão).
Depois ainda, foram também
professores na mesma Escola: Elpídio Procopio Alves Pereira e Catão Gomes
Jardim, de Aritmética e Geometria; José Teodoro de Sousa Lima (o Cavaquinho).
de Aritmética; dr. Francisco Brant, de Geometria-, Juscelino da Fonseca Ribeiro,
de Pedagogia, Artur Napoleão Alves Pereira, de Física e Química; Artur
Queiroga, de Geografia e Historias do Brasil; Américo Diamantino Costa França,
de Ginástica.
Professores substitutos:
Sebastião Pereira Corrêa, Olímpio Julia de Oliveira Mourão, Sebastião Rolim e
José Augusto Neves, este já nos últimos anos da Escola, que foi suprimida no
governo Silviano Brandão.
Diamantina teve também um
internato, que funcionava pela manhã, no pavimento térreo do prédio da Escola. Foram
diretores dessa antiga Escola Normal de Diamantina :
Dr. Manoel Alves Prado, Cônego
Manoel Alves Pereira, dr Teodomiro Alves Pereira, Mons. Augusto Julio de Almeida,
dr. Francisco Brant e Joaquim José Pedro Lessa.
Foram porteiros, de que me
lembro; José Teodoro Rodrigues Bago; José Eleuterio de Queiroz Amara!,. Francisco
Regulo Perpetuo e Joaquim Aprigio dos Santos.
Figuras populares, que não
mencionei na minha relação, na edição da "Voz de Diamantina", por
ocasião do Centenário da cidade: Procopio Cotuvum, que viajava pelo sertão do
Estado,
com um saco ás costas, mascateando
mercadorias; Agostinho Bambães, cadáver terrível; Joaquim Cocô, sempre
mancando; Juca Tundá, tocador de caixa, no Corão», musico e amador dramático; Ântero
Soares, que imitava, perfeitamente, o papagaio; Cavalo de Berenguer e Maria
Bate Pau, mulheres, aguaticas e populares; Frutuosa Pau de Sebo, original
figura, que vendia os deliciosos caragés; João Pilatinho, mestre de dança de
caboclinhos; o louco Chico Roque, que há mais de 80 anos, escondido na Sé, no sábado
de Aleluia, atrás da cortina preta, cantou, muito entoado, o Glória, antes do
celebrante, fazendo romper as Aleluias, antes da hora; Chico Muchiba, imberbe,
que imitava o apito do trem de ferro e dava palpites para o jogo do bicho;
Celestino Potassa, tipográfico filósofo, João Ligeiro, que andava de vagar;
Ernesto Manco, preto como
azaviche, negociante, pedrista, no Beco Escuro, travessa da Rua da Quitanda,
para o Beco do Motta, e que foi á França, onde foi dispor de partidas de
diamantes, e de onde voltou, tendo estado em Paris, e admirado de ver as
crianças ali, falando francês (admirável 1...); Relógio e Camuquenque,
africanos feiticeiros; Pedro Bigorrinha, Curricho, o chamado cara de passara;
Cassimiro do Cláudio, cantor sonoro; Juca da Toca, Belaguarda, Raimundo Gogo,
Piolho, de cabelos compridos, Aninha Dunga e outros, certamente, ainda não
lembrados
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