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domingo, 9 de abril de 2023

D. JOÃO FELÍCIO DOS SANTOS - PRIMEIRO BISPO DE DIAMANTINA

 

Celebrando-se, este ano, o jubileu de ouro da Abolição da Escravidão no Brasil nos é

reivindicar para o primeiro bispo de Diamantina a honra de ter sido um dos mais entusiastas

dentre os abolicionistas mineiros. Mais justo colocar o busto do primeiro bispo de Diamantina numa praça tão especial que leva o seu nome e ao mesmo tempo por ter sido um grande humanista.

Espírito arguto no estudo das úlceras sociais do seu tempo e conhecedor esclarecido da

doutrina da Igreja Católica de que era digno Pastor neste longínquo rebanho diamantinense, D.

João Antônio dos Santos soube formar ideias justas e severas a respeito da escravidão dos

africanos no Brasil, junto com os seus irmãos Joaquim Felício dos Santos e Antônio Felício dos Santos e João Felício, fervorosos na questão da abolição e da república no Brasil.

Seu coração, sua ciência, sua piedade e seu patriotismo fizeram dele um resoluto

abolicionista.

                                    IMAGENS DA INTERNET - 

            Nos jornais periódicos da cidade, principalmente do órgão da Igreja, D. João cobrava dos seus compatriotas a luta pela liberdade dos escravos, que não era bem aceita por aqueles que possuíam e defendiam os seus interesses em manter a escravidão a qualquer custo.

Tendo-lhe D. Viçoso confiado, em 1845, a redação da Selecta Católica, deu á estampa

vários artigos contra a escravidão, o que lhe valeu as iras dos assinantes possuidores de

escravos. Devolveram o jornal, com o endereço a D. Viçoso.

“Recebido o pacote, - conta o Cônego Severiano, - mandou o Prelado chamar o Redator

a palácio e referiu-lhe o que se acabava de dar.

- Então? – Disse-lhe D. Viçoso.

- Neste caso, o remédio é muito fácil, - respondeu-lhe o interrogado. Eu me retiro da

Redação e V. Exmª. faça substituir por outro que não desagrade os assinantes.

O Prelado não esteve pelo alvitre, acrescentando que ambos eram da mesma opinião

sobre o magno assunto, e tanto assim que já havia publicado um escrito seu em prol da

liberdade que se devia dar aos cativos. Com toda a pressão em cima de D. João o primeiro bispo da nossa diocese não se intimidou, com sua simplicidade e inteligência, driblou os oposionistas e continuou a sua campanha contra a escravidão.

Entrados em acordo, continuou a escrever como dantes, no órgão oficial da Diocese, só

deixando o cargo, que tão bem havia desempenhado, quando teve de seguir para Roma”.

            D.João e seus irmãos Joaquim Felício dos Santos e Antônio Felício dos Santos eram contra a escravidão e defendiam abertamente o fim da monarquia e favores a República. Este fato conhecido pelo Imperador D. Pedro II, que não gostava nada dos ataques de Joaquim Felício dos Santos que fazia nos jornais e uma longa campanha para o fim do regime da monarquia. Suas críticas ferrenhas criava um enorme embate entre os poderes políticos da cidade que eram os conservadores a favor da manutenção da monarquia e da escravidão, e os liberais que eram contra a escravidão e o fim da monarquia. D. João o bispo de Diamantina, era a favor da república e com isso criava um grande impasse entre a Igreja local e o Imperador. Para não ser preso como aconteceu com os bispos do nordeste  por serem contrário a monarquia, D. João foi enviado para Roma para fazer o seu doutorado e de lá foi para a França onde concluiu vários cursos importantes na sua carreira.

Voltando ao Brasil, quer como padre, quer, depois, como bispo, D. João continuou

defendendo as mesmas ideias a respeito da escravatura e o fim da monarquia juntamente com os seus irmãos.

Em 1870, com a valiosa colaboração da Câmara Municipal, chefiou, em Diamantina, a

organização de uma Associação pia, cujo fim era promover e acelerar a emancipação dos

escravos: a Irmandade de Nossa Senhora das Mercês.

No começo de julho de 1870, dirigiu aos possuidores de escravos a seguinte circular, em

nome da Câmara Municipal:

“Ilmo.Snr.

A Ilustríssima Câmara Municipal desta cidade se dirige a todos os possuidores de

escravos neste município, convidando-os para uma grande reunião nesta cidade, afim de tratar

se da libertação dos cativos nela existentes.

Tomando eu parte na referida manifestação de humanidade e justiça, que será ao mesmo

tempo uma distinção e uma glória para o nosso município, rogo a V. S., em nome da nossa

Santa Religião, que aceite o convite que lhe é feito, e que, ainda com sacrifício, não deixe de nela

comparecer no dia marcado.

Deus nosso Senhor o abençoe e toda a sua família.

Sou, com estima,

De V.S.

Amigo e servo muito obrigado,

João, Bispo de Diamantina”.

No dia 11 de julho de 1870, houve a reunião, presidida pelo ínclito Diocesano e com a

presença, entre outros cidadãos, dos Srs. Josefino Vieira Machado, João Felício dos Santos,

Dr. João Raimundo Mourão e Comentador José Ferreira de Andrade Brant. Ficou fundada a

benemérita e patriótica “Pia Sociedade de Nossa Senhora das Mercês”.

O Art Iº. Dos seus estatutos dizia: “Fica instituída nesta cidade da Diamantina, com o fim

de auxiliar a emancipação do elemento servil, uma pia sociedade, sob os auspícios de Nossa

Senhora das Mercês”.

Em outros artigos dos mesmos estatutos vem mais especificada a finalidade da

Associação. Vejamo-los:

“Art. 3º - Serão aceitos donativos, ainda que sejam para alforria determinada, e neste caso

não poderão ser aplicados a outro fim.

Art. 6º - São considerados sócios honorários ou benfeitores quantos,... libertarem em

nome dela, escravos de qualquer valor, ou prestarem serviços relevantes á causa da

emancipação.

Art. 7º - Todos os sócios tem o dever de proteger as causas de liberdade, quando justas.”

No capítulo III, art. 10º, D. João Antônio dos Santos é proclamado Presidente Perpétuo da

Sociedade.

Nas atribuições da Diretoria, estatue a letra d: “Alforriar escravos na proporção dos fundos

sociais disponíveis, conforme as regras dos artigos 25 e 26”.

Entre as atribuições dos Procuradores está (art. 20.; letra c) a de : “Inquirir com empenho

quais os escravos que, por sua conduta e outras circunstâncias, devam ser preferidos pelos os

benefícios da Sociedade.

Art. 25º. – Em regra, para a alforria dos escravos, deverão ser preferidas as mulheres aos

homens até a idade de 40 anos; as casadas ás solteiras; as que tiverem filhos vivos ás que não

os tiverem; os que forem sócios aos que não o forem. Em igualdade de condições, recorrer-se á

sorte.

Art. 26º - Poderão ser auxiliados os escravos que tenham parte do dinheiro necessário

para a sua alforria, ou cujos senhores façam abatimento no seu valor”.

Nos anexos aos Estatutos, são para notados;

“Art.Iº. – A Sociedade, cada ano e por meio de sorte, distribuirá prêmios de um conto de

réis pelos seus sócios escravos que anualmente houverem contribuído com a quantia de 20$000,

na razão de um prêmio por 50 dos sócios.

Art. 3º - Se a quantia saída por sorte não cobrir o preço da liberdade do escravo premiado,

a Sociedade o poderá inteirar com os fundos que tiver em caixa”.

O capítulo único da letra B dos anexos estatue:

Art. 1º - Desejando auxiliar os seus membros escravos por todos os modos possíveis, a

Sociedade por eles distribuirá pela sorte cada ano, prêmios de 200$000.

Art 2º - No fim do cinco anos, os mesmos terão o direito a um auxílio de 75$000; no fim de

dez, 180$000; no fim de vinte, 520$; no fim de 25 a 29, um conto de réis”.

Está-se vendo a eficiência com que a Sociedade se propunha promover e incentivar a

emancipação do elemento servil, tudo sob a orientação sábia de D. João.

O primeiro Bispo de Diamantina escreveu, em 28 de setembro de 1887, uma vibrante

Pastoral aos seus diocesanos, e nela se pronunciou francamente pela Abolição.

Nesse importantíssimo e patriótico documento, tendo de anunciar ás suas ovelhas as

festas do jubileu sacerdotal do papa Leão XIII, D. João recomendava, como a obra mais

significativa e oportuna, a libertação dos cativos e o amparo aos que já tivessem obtido a

liberdade.

Essa Pastoral do virtuoso Antiste repercutiu grandemente em todo o país.

Quando o projeto da Lei Aurea foi discutido no Senado, no dia 10 de maio de 1888, um

Senador abolicionista, em abono de seu voto, citou a Pastoral de D. João e lembrou a sua

proposta sobre um golpe de Estado.

Um membro da oposição exasperou-se com a citação e bradou que o Bispo de

Diamantina deveria ser “criminalmente responsabilizado pelo seu ato”.

Por aí se avalia o peso da opinião do prelado mineiro na importância pendência.

D. João, bispo de Diamantina, muitas vezes agasalhava os escravos, como também lhe

dava de comer e dinheiro para seguir viagem.

Entrado no ano de 1888, - narra o seu biografo Cônego Severiano de Campos Rocha, por

muitíssimas vezes ia pelas ruas da cidade, e batia á porta de todas as casas onde houvesse

possuidores de gente escrava, e aos mesmos pedia um grande favor, qual era o da liberdade

para aqueles que assim conservavam e gratuitamente o serviam.

Desse modo, conseguiu na Diocese umas 2.000 cartas de alforrias.

D. João e o 13 de maio, quando aqui chegou a notícia da libertação final de todos os

escravos do Brasil.

“No mesmo dia da sanção, por via telegráfica, foi a grata notícia transmitida para a Diamantina.

Estando D. João no Biribiri, lá recebeu a grata notícia da  extinção do elemento servil em nosso país, e logo mandou apressar o troli em que costumava viajar e pôs-se a caminho da cidade.

Entretanto, e sem perda de tempo, ia-se preparando uma festividade pública, um sinal do contentamento de que exultavam quantos haviam tomado parte na grande luta e, portanto, na vitória de foi ela coroada.

Enquanto isto se fazia, soube-se que D. João não tardaria chegar do Biribiri. Os

organizadores da festividade, seguidos de pessoas de todas as classes, se dirigiram para o alto

da cidade, e ao subirem a rua da Glória, avistaram o troli que conduzia o Prelado, descendo pela

mesma rua. Estugaram então o passo e ao enfrentarem o carro, fizeram parar os animais,

desatrelando-os, no intento de os substituir, o que não conseguiram, em obediência a D. João,

que com eles desce a pé atravessando a cidade até o passo episcopal.281

A festa cívica realizou-se ao cair da noite, na praça fronteira ao Grupo Escolar, e que

então o Paço da Municipalidade, e em cujo frontispício fartamente iluminado com lanternas de

várias cores, flutuava a bandeira nacional.

Junto ao alto paredão da Catedral construiu-se um luxuoso palanque reservado a pessoas

gradas, das quais a primeira era D. João, a quem, na hora previamente ajustada, uma numerosa

comissão composta de distintos abolicionistas, foi buscar ao palácio, acompanhando-os uma

banda de música do Corão, do palácio para a praça.

Uma vez no seu lugar de honra, em companhia de vários sacerdotes, executado o Hino

Nacional, discursaram sobre o assunto do dia o Dr. Álvaro da Matta Machado, Arthur Queiroga,

Dr. Francisco Rabelo, enaltecendo as peregrinas virtudes do Prelado e o muito que havia feito

pela libertação dos escravos.

A Estrela Polar, D. João Antônio dos Santos – um dos mais célebres abolicionistas mineiros pág,1, ano XXXVI, nº 20 , Dtna, 15 de maio de 1938.


 

 


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