Abrindo uma janela da sala de visitas, debrucei-me á
sacada. Na rua começava um pequeno movimento. Os raios do sol nascente
começavam a diluir a garôa. O primeiro edíficio que me atraiu a atenção foi a
Faculdade de Direito, no mesmo prédio em que funcionaram sucessivamente,
remontando ao passado, o Grupo Escolar (inaugurado em 1907), a Escola Normal
(extinta emm 1904) e o Externato Diamantinense, cujas aulas frequentei em 1890.
Lembrava-me do aspecto daquela praça
nesta última época: a multidão de burros e cavalos no largo enlameado em frente
ao rancho de tropas que ali havia, chamado de “Intendência de Cima”, para
distinguí-lo do de dois outros ranchos que existiam na praça da Cavalhada Nova;
a “Intendência do Meio” e a “Intendência
de Baixo”. Surgiam-me á memória desse passado de sessenta anos, os meus antigos
professores no externato: Sebastião Corrêa Rabelo; seu irmão, dr. Francisco
Corrêa Rabelo; o doutor Pichico, como era conhecido; José Teodoro de Lima, por
alcunha O Cavaquinho, profundo latinista; João Nepomuceno Kubitschek, o celebre
autor do poema “Hermengarda”, e outros.
Lançando o olhar para a rua Atrás da
Sé, lembrava-me de seu alargamento e calçamento que eu vira ser feito, em 1887,
por condenados á prisão pepétua, infelizes galés, encorrentados pelos pés, dois
como saldumes da desgraça.
Olhando á esquerda um opulento
bazar, lembrava-me de ali ter visto, sucessivamente, as razões sociais Motta,
Cajgas & Companhia, Sampaio, Motta & Companhia; sempre a mesma casa
comercial, dirigida pelo honrado português , João Francisco da Motta, falecido
em 1930. Essa casa, “Ao Grande Empório do Norte”, foi durante meio século o
bazar mais importante do Norte de Minas.
Retirando-me da sala de visitas,
atravessei diversos quartos da casa, até a antiga sala de jantar, que dá para o
Beco da Tecla, a uma altura de sete metros mais ou menos. Vi, um pouco abaixo,
as janelas do apartamento em que morávamos eu e meus irmãos, o afamado
“Quilombo”, local da redação de dois jornais violentos “O Itambé” (1902 a 1905)
e “A Idéa Nova” (de 1906 a 1912), centro
de confabufações políticas, onde nasceu a célebre associação secreta “Delenda
Cartago”, que venceu estrondosamente as eleições municipais de 1907.
PSA, A
Metropole do Norte, pág. 2, ano XXVII, nº 7, Dtna, 13 de novembro de 1932.
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